Esse foi o enfoque principal de Tsuyoshi Murakami, chef do Restaurante Kinoshita, ao participar da série “Curso no Museu”, promovido pelo Museu Histórico da Imigração Japonesa no Brasil.
O encontro aconteceu no último dia 7 de abril, no 9º andar do Museu, com cerca de 40 pessoas – ocasião em que o convidado preferiu responder perguntas à simplesmente discorrer sobre o tema “Beleza à Mesa”.
O Kinoshita, reconhecido entre os melhores (e premiados) restaurantes japoneses do Brasil, é uma das casas mais emblemáticas na trajetória na culinária japonesa na capital paulista.
Localizado no coração do bairro da Liberdade, o espaço rapidamente firmou-se como um dos concorridos restaurantes do núcleo pioneiro da culinária japonesa na cidade. Tornou-se um local-referência não só para quem desejava saborear a comida japonesa (e conhecia o básico da língua!) durante a semana, ou nas reuniões familiares (ou de amigos!) de final de semana.
Restaurante familiar como outros daqueles anos 1960/70/80, não raro, no final do expediente, o próprio Kinoshita enrolava seu avental e se misturava aos fregueses para um animado bate-papo.
Cada um tinha seu prato predileto como motivo para frequentar o Kinoshita. Um dos grupos memoráveis que se reunia para o almoço do sábado era constituído por jornalistas da velha guarda (eram amigos, embora trabalhassem em jornais concorrentes!) e funcionários de diferentes empresas nikkeis (por exemplo, Banco América do Sul). Os pratos pedidos eram variados, mas a unanimidade entre eles era o kare raisu (arroz com curry).
Mas, voltando à história, desde a década de 1980, ficavam cada vez mais evidentes as mudanças no cenário do bairro da Liberdade e nos restaurantes japoneses.
Emblemático, nessa época, foi o surgimento da Estação Liberdade do Metrô em contraste com os tyotins (luminárias em forma de lanternas) reforçando a identidade local.
Quanto aos restaurantes japoneses, alguns resolveram subir a Avenida Brigadeiro Luiz Antônio em direção à avenida Paulista para aproximar-se da concentração das empresas japonesas que, desde a década de 1970, estacionaram em território brasileiro.
Nesse burburinho de mudanças, a geração pioneira deixou o comando para as próximas, não só nos restaurantes, mas nas lojas, nos escritórios, mas agências de viagens, etc.
Foi em 1995 que o balcão dos sashimi/sushi do Kinoshita passou a ser ocupado por um belo jovem sushiman, falante e carismático que, combinava a excelência dos peixes com longos papos e histórias trazidas por ele. Com leve sotaque carioca, impecável na língua japonesa, Murakami reportava suas passagens pelos restaurantes do mundo!
Bom, a história, a partir disso, todos sabem – ele virou genro do proprietário e, junto com Suzana, a eleita, deixaram a Liberdade com destino a Vila Nova Conceição.
O chef Murakami, que prefere ser chamado por seu primeiro nome, Tsuyoshi, trouxe para seu público o kappo ryori, sem tradução exata para o português, que dá margem para diferentes interpretações. Certamente, uma delas resulta da combinação entre a alta e sofisticada gastronomia com a ousada criatividade do chef.
“Se pensar muito não dá. A apresentação de cada prato sai naturalmente”, ensina o chef, lembrando o ritual de um mestre de shodô diante de um papel washi e seu pincel. Em segundos a caligrafia está pronta, como o gesto final de um longo caminho de preparativos e vivências.
Tsuyoshi contou que a inspiração de sua culinária está ancorada na “comida da mamãe”, com a simplicidade original do arroz, misoshiro, fazer o chá, “todos preparados com muito amor”.
Durante sua palestra, falou sobre a relação intrínseca que o cozinheiro tem com os elementos essenciais da preservação da vida e o oferecimento desse sustento vital aos seus visitantes.
“Não se trata de fartar-se, ficar com a barriga cheia até não se aguentar”, ensina. “Aqui vale o ditado, o menos vale mais, ou seja, servir-se o suficiente para renovar as energias”.
Nesta noite de palestra, várias vezes, o chef também se referiu ao “Kinoshita Education”, que busca no cotidiano do restaurante transmitir aos seus funcionários e estagiários os preceitos básicos essenciais de quem se propõe a preparar o alimento com excelência. Uma forma, certamente, de se manter fiel à tradição.
Só para terminar a história: o kare rice não é mais servido no Kinoshita, apesar de os clientes ainda pedirem.